Cérebros terão versão digital dentro de 20 anos. |
Os serviços de saúde costumam absorver as mudanças tecnológicas sempre de forma mais lenta, embora constante, devido ao excessivo número de testes necessários para que os novos produtos sejam usados com segurança. Porém, com as novas tecnologias ganhando cada vez mais espaço, a tendência é que a telemedicina, a robótica, a internet das coisas (IoT na sigla em inglês) e a inteligência artificial impulsionem a revolução médica que será vista nos próximos 20 anos.
Smartphones diagnosticando doenças, implantes biônicos e cerebrais, próteses por impressão 3D e cirurgias feitas por robôs são apenas algumas das novidades em processo de desenvolvimento ou em fase experimental, segundo o empreendedor brasileiro radicado no Vale do Silício, Reinaldo Normand, em seu livro “Innovation²”, e avaliadas por ele como as principais tendências.
Ele projeta ainda que criar novas formas de vida, ou mesmo ressuscitar espécies extintas, será possível em 20 anos, e que a primeira etapa da engenharia reversa do cérebro terá sido finalizada com sucesso – um exemplo é a pesquisa Blue Brain Project (BBP), que pretende recriar uma mente humana em ambiente digital. “Começaremos a colocar em prática a ideia de enviar nossa consciência para a nuvem (provavelmente na década de 2040)”, complementa.
O BBP é um projeto científico financiado pelo governo suíço e doações de indivíduos, cujo objetivo é construir uma simulação computadorizada do cérebro de mamíferos. O projeto atualmente tem um modelo de software de dezenas de milhares de neurônios, cada um deles diferente, que os ajudou a construir, artificialmente, uma coluna neocortical.
A equipe responsável coloca os dados gerados pelos modelos junto com alguns algoritimos - uma sequência de instruções para solucionar um problema - em um supercomputador com 10 mil processadores. O objetivo é extrair essa representação e projetá-la, permitindo que os pesquisadores vejam diretamente como o cérebro funciona. Segundo os especialistas, além de ajudar na compreensão dos mecanismos do órgão, o projeto pode oferecer novos caminhos para se entender os problemas mentais.
Para Normand, uma máquina capaz de substituir o coração continua sendo o “Santo Graal” da medicina moderna. Depois de uma empresa francesa realizar duas tentativas malsucedidas, em março de 2015, uma companhia norte-americana anunciou o primeiro coração verdadeiramente biônico do mundo (BiVACOR). O dispositivo artificial que poderá substituir o órgão biológico foi implantado com sucesso em uma ovelha, e os primeiros testes em pacientes humanos estão programados para 2018.
Com mais de 20 anos de experiência na indústria de tecnologia, Normand, que também é consultor de diversas startups e membro do conselho da Hilab – instituição sem fins lucrativos que visa revolucionar a saúde em países emergentes –, projetou em seu livro vários avanços até 2035.
“Encontraremos curas para câncer, Aids, lesões na medula, diabetes, Alzheimer e outras doenças. Em países desenvolvidos, a fabricação e a descoberta de novos medicamentos serão majoritariamente realizadas por robôs e softwares de inteligência artificial. Em menos de cinco anos, um computador lerá exames radiológicos com muito mais precisão que um médico”, escreveu.
Os nanorrobôs também são outros exemplos em estágio avançado de desenvolvimento. Esses minúsculos equipamentos poderiam ser injetados no corpo para entregar medicamentos, detectar doenças ou reparar células danificadas. O professor Moshe Shaham, chefe do Laboratório de Robótica do Instituto de Tecnologia de Israel, e sua equipe desenvolveram uma mosca robótica com cerca de 0,04 polegadas de diâmetro que pode identificar artérias bloqueadas.
Preparação. Segundo o médico Fábio Henrique Gregory, responsável pelos novos projetos do hospital Sírio-Libanês, “a inteligência artificial vai constituir assistentes inteligentes para o médico”. O hospital realizou, na semana passada, seminário sobre a medicina daqui a 20 anos.
Cientistas da computação do laboratório mineiro de inteligência artificial Kunumi trabalham num projeto piloto executado dentro da UTI do Sírio-Libanês utilizou variáveis de 6.000 pacientes para gerar um padrão que ajudasse a prever desfechos de mortalidade, complicações e tempo de internação.
O sistema teve um desempenho 26% superior na previsão de óbitos. Foram utilizados princípios de Big Data, Machine Learning e Deep Learning para criar padrões preditivos na construção e na análise de cenários em um ambiente de grande complexidade. “O hospital tem um projeto piloto na oncologia que usa a telemedicina para acompanhar pacientes em tratamento de câncer (sob autorização) por meio de aplicativos. Esses apps identificam padrões que podem ajudar a achar alterações”, diz Gregory.
Médicos ficariam mais próximos dos pacientes
O Ministério da Educação e o Conselho Federal de Medicina (CFM) possuem três resoluções que normatizam a incorporação e a prestação de serviços de telemedicina e telerradiologia. Segundo o coordenador da Comissão de Ensino Médico do CFM, Lúcio Flávio Gonzaga, as universidades devem se adequar.
O médico radiologista Conrado Cavalcanti, coordenador do Comitê de Vanguarda do Hospital Sírio-Libanês, avalia que a Inteligência Artificial (IA) vai aumentar a produtividade do médico. “Vão tirar muito trabalho do médico. Vai sobrar mais tempo para o profissional se dedicar ao paciente”, diz.
O diretor da Unimed-BH, José Augusto Ferreira, concorda. “Apesar de toda tecnologia, vamos resgatar a medicina olho a olho. O médico vai ter que saber usar as ferramentas do passado e as tecnológicas para cumprir melhor ainda sua função”, analisa.