Abragames emite nota de repúdio as declarações do presidente da Anatel. |
No dia 18 de abril de 2016, em entrevista coletiva dada em Brasília, Rezende declarou: "A gente sabe o que acontece principalmente com games online, né? Tem gente que adora, fica jogando né? O tempo inteiro, e isso gasta um volume de banda muito grande. É evidente que algum tipo de equilíbrio há de se ter porque, senão, nós teremos o consumidor que consome menos pagando por aqueles que estão consumindo mais”.
Veja a nota completa da Abragames.
"Em primeiro lugar, a limitação e corte prejudicarão diretamente todos os pequenos estúdios de desenvolvimento de games, maioria no Brasil e na Abragames. Uso de internet e transferência de grande volume de dados é parte corriqueira do trabalho com desenvolvimento de jogos. Limitar isso trará, na melhor das hipóteses, aumento nos custos fixos diretos das desenvolvedoras. E no pior dos casos, impossibilidade de desenvolver seus projetos com a infra-estrutura adequada - especialmente para competir no mercado global. A Abragames condena veementemente uma medida que prejudique o trabalho de suas associadas.
Em segundo lugar, não é o papel da Anatel julgar quem faz o quê com sua banda contratada. Segundo seu próprio site, “A missão da Anatel é promover o desenvolvimento das telecomunicações do País de modo a dotá-lo de uma moderna e eficiente infraestrutura de telecomunicações, capaz de oferecer à sociedade serviços adequados, diversificados e a preços justos, em todo o território nacional”. Não existe qualquer menção sobre mensurar e avaliar o que os cidadãos fazem com seus dados contratados. Fica claro que o posicionamento com relação a jogar é inadequado e fora da alçada da Agência reguladora. Entendemos que qualquer um pode fazer o uso que bem entender de seu acesso à internet, desde que dentro da lei.
Em terceiro lugar, o conteúdo da fala e o tom utilizado levantam preocupações com uma série de conceitos que condenamos: preconceito, segregação e desinformação.
Há uma preocupação com Preconceito pois tal tipo de tom (“Tem gente que adora, fica jogando né?”) trata quem adora jogar como se fosse menor de alguma maneira, como se jogar não fosse uma forma de entretenimento tão válida quanto qualquer outra. Além de se mostrar retrógrado e limitado, tal raciocínio demonstra que, aparentemente, a Anatel não observa que jogos, hoje, são uma mídia de popularidade incontestável. O Brasil é o 11º mercado de games em faturamento, segundo esta pesquisa. E vale registrar que quem joga no celular também se encaixa no critério “adora, fica jogando”, e já são mais de 154 milhões de smartphones no Brasil.
Condenamos caminhos de Segregação pois é absurda e sem sentido a divisão entre “jogadores” e “não-jogadores”, que pode tornar quem joga em uma espécie de bode expiatório bizarro das decisões impopulares e que ferem os direitos do consumidor e o Marco Civil da Internet. “A Anatel parece se esquecer que nenhuma norma ou resolução institucional pode ser contrária ao que define a legislação”, disse Claudio Lamachia, presidente da OAB, à Folha de S. Paulo. Colocar a culpa no comportamento e uso de banda dos jogadores é vergonhoso, inadmissível e, claro, foge completamente do escopo das funções da Anatel.
E buscamos sempre evitar a Desinformação: ficar jogando por muito tempo não gasta toda esta banda que a declaração dá a entender. Jogar online usa menos banda do que assistir ao Youtube, ao Netflix, Apple TV ou qualquer outro serviço de streaming de vídeos durante o mesmo período de tempo. O que gasta mais banda é fazer download de jogos grandes – assim como baixar filmes em Alta Definição, softwares complexos ou qualquer arquivo grande em termos de MB/GB. Não é “ficar jogando” que gasta banda. Há aqui uma matéria interessante (em inglês) sobre o assunto, explorando os usos de banda para finalidades comuns.
Em quarto lugar, ao endossar a limitação do uso de dados e ser conivente com a possibilidade de corte do serviço desde que o usuário seja avisado, a Anatel assume um posicionamento favorável à maior exploração do consumidor; dificulta o acesso livre à internet, suas informações e todos os seus benefícios; e ignora o efeito de longo prazo que este tipo de política pode ter na construção de um país educado, informado, atual e competitivo. Assim, não faz o papel que lhe cabe: defesa dos cidadãos e dos interesses do país, contrariando sua própria missão ao permitir uma prestação de serviço inadequada às necessidades da população.
Importante registrar que, embora a medida anunciada tenha adiado por 90 dias a ação proposta tenha soado como uma vitória de quem defende uma internet ilimitada e livre, o presidente da Anatel foi bastante claro ao afirmar que “A regulamentação da Anatel autoriza a cobrança e limite de franquia”.
Em quinto lugar, afirmar que o consumidor que consome menos vai pagar por aqueles que estão consumindo mais é uma técnica retórica bastante discutível, que parte do princípio que existe um número finito de dados a ser consumido de modo compartilhado pelos usuários. Este não é o combinado com o consumidor.
Além disso, existem planos com velocidades diferentes – e cada um assina o que melhor lhe convier. Ninguém ”usa” dados do outro desde que as operadoras cumpram o que prometem na venda. Vale registrar que a norma em vigor da Anatel já é maleável com as velocidades: hoje, a garantia mínima de velocidade que as operadoras devem assegurar é de 40% da velocidade contratada. A média deve ser 80% da velocidade contratada, segundo informações da própria Anatel.
Assim, a Abragames reforça seu posicionamento favorável a uma internet livre e neutra, que permita não só jogar, mas também se comunicar, informar-se, produzir e consumir conteúdos de todas as mídias, e o que mais for interessante para cada pessoa, sempre respeitando a liberdade individual e as leis em vigor.
Embora outros países pratiquem o modelo com limitação de dados, entendemos que é um modelo péssimo para ser seguido no Brasil, onde a internet pode e deve desempenhar um papel crucial no progresso e aumento da competitividade de setores estratégicos – desenvolvimento de jogos, inclusive – no contexto mundial.
Concluímos reforçando que as palavras proferidas no sentido de isolar os jogos das demais formas de consumo de banda na internet e colocá-los como culpados pela medida de limitar a banda são lamentáveis e equivocadas. Discordamos e defenderemos com firmeza o direito de uso da internet no Brasil para jogar e desenvolver jogos – bem como para todos os outros fins para os quais a internet pode se destinar."
São Paulo, 20 de Abril de 2016
Diretoria Abragames - Gestão 2016-2018