Brasileira cria o "Tinder para produtos" com a ajuda da Universidade de Harvard. |
A estudante de Comunicação Jéssica Behrens, 23 anos, teve uma
ideia empreendedora que começou com um exercício de desapego. Jéssica
decidiu se desfazer de um pertence por dia ao longo de um ano, seguindo
uma sugestão encontrada na internet. A ideia era viver com o mínimo
necessário. As dificuldades para pôr em prática essa filosofia de vida
fizeram a estudante, que está prestes a se formar pela Universidade de
Brasília (UnB), perceber um mercado a ser explorado e lançar uma empresa
com apoio da Universidade de Harvard.
"Percebi que não conseguia encontrar gente de forma rápida para ficar
com minhas coisas. E eram coisas legais, não podiam ir para o lixo. Aí
eu percebi que não existia uma forma rápida e fácil de conectar minhas
coisas às pessoas que estavam precisando delas. Um dia tive um insight.
Pensei: 'e se existisse um Tinder para produtos?'", conta, referindo-se
ao aplicativo de paquera online. No Tinder, o usuário visualiza
fotos de outros interessados em se relacionar e seleciona potenciais
parceiros. No Tradr, o aplicativo criado por Jéssica, as imagens são de
produtos à venda.
A
ideia começou a virar realidade quando ela comentou o assunto com um
amigo. "Ele se formou em Harvard. Achou a ideia muito legal e me colocou
em contato com pessoas que ele conhecia que desenvolviam startups
(em tradução livre, começar algo, normalmente uma empresa, a partir de
uma ideia inovadora). Duas pessoas largaram projetos que estavam fazendo
para participar desse. A gente passou por um processo seletivo e foi
aceito no Laboratório de Inovação de Harvard", recorda Jéssica, que
viajou para os Estados Unidos. A universidade cedeu a infraestrutura, e o
grupo conseguiu patrocínio de um pequeno investidor.
Segundo Jéssica, dois fatores foram determinantes para que a
universidade norte-americana considerasse o projeto inovador e decidisse
apoiá-lo. "Primeiro, porque a gente desenvolveu um algoritmo que,
conforme a pessoa usa o aplicativo, registra as coisas que ela gosta e
mostra cada vez mais produtos daquele tipo. Também porque consideraram
que ele [o aplicativo] fomenta a economia colaborativa. É uma forma de
conectar as pessoas, ver o que alguém está vendendo a 50 metros de você.
Isso cria um espírito de comunidade, estimula a comprar e vender
localmente. E é bom para o meio ambiente, pois você está deixando de
consumir coisas novas", explica a estudante.
Jéssica ressalta que o aplicativo pode ser, também, uma plataforma
para quem tem interesse em empreender. "A gente abre um espaço para a
economia marginal, como pessoas que produzem artesanato e não têm espaço
para loja física ou rios de dinheiro para gastar com marketing digital", comenta. A estudante explica que cuidou da parte de design,
arquitetura da informação, marketing e comunicação no desenvolvimento
do aplicativo. Seus colegas de projeto ficaram responsáveis pela
programação, pelas finanças e pelo desenvolvimento de um algoritmo.
Atualmente, o aplicativo, que está disponível há cerca de um mês em
versão beta - versão para teste - tem 2,2 mil usuários.
O Tradr está disponível para download
e, por enquanto, funciona apenas no sistema iOS, da Apple. A
participação é gratuita e, de acordo com Jéssica, os desenvolvedores
ainda estudam uma forma de monetização do aplicativo. A ideia é
continuar não cobrando dos usuários comuns. "A gente estuda fornecer um
serviço de inteligência de dados para quem quiser ter uma conta premium.
Por exemplo, a pessoa está colocando à venda um sapato vermelho e outro
branco e a gente consegue mostrar a ela estatísticas de qual dos dois
tem mais aceitação", exemplifica.
O professor do Departamento de Administração da UnB José Pinho,
especialista em RH, marketing e estratégia empresarial, afirma que as
possibilidades criadas por recursos como a internet e o surgimento das
redes sociais ajudam o empreendedorismo, mas não são determinantes. "O
desenvolvimento das comunicações ajuda porque abre muitas perspectivas. A
pessoa vê as coisas acontecerem, percebe as necessidades. Mas isso não é
determinante. Antes de haver internet, Thomas Jefferson tinha um monte
de invenções. Cada uma, ele transformava em empresa. Simplesmente,
agora, [a internet] estimula e evidencia as oportunidades", ressalta.
Segundo Pinho, entre as características de quem tem perfil
empreendedor estão capacidade de assumir riscos e pensamento a longo
prazo. Para o professor, o ambiente no Brasil não é favorável para
empreender.
"Vamos supor que você tem R$ 200 mil. Você vai entrar em um negócio,
pagar 40% de imposto e sair com um lucro que vai representar mais ou
menos 20% [do investimento], correndo risco? É preferível só aplicar e
sair com todo o dinheiro e mais um pouco do outro lado. Aquele
capitalismo de ter uma boa ideia, constituir empresa e crescer foi
praticamente abolido pelo capitalismo financeiro", comenta. Para ele, o
maior problema para as empresas no país é a alta carga tributária.
Fonte: INFO.